PF pediu a prisão de 22
Diário Catarinense ; Felipe Pereira ; 19/9/2008
A Proactiva teria pago R$ 1 milhão a vereadores e a um ex-prefeito de Biguaçu para fraudar a concessão que definiria a empresa que vai fornecer água no município. Outra parcela no mesmo valor ainda seria repassada aos suspeitos.
As informações constam da decisão da juíza substituta da Vara Federal Ambiental Marjôrie Cristina da Silva, que autorizou as prisões da Operação Dríade, deflagrada na quarta-feira pela Polícia Federal (PF).
O documento, ao qual o Diário Catarinense teve acesso exclusivo, aponta que os responsáveis pelas empresas Inplac, Proactiva e Schaefer Yachts teriam corrompido servidores da Fundação do Meio Ambiente (Fatma) e políticos de Biguaçu para conseguir aprovar obras que tinham interesse. A PF pediu a prisão de 22 pessoas que estariam envolvidas com o esquema, mas somente 14 foram autorizadas pela Justiça. Oito foram excluídas por, segundo a juíza, não serem consideradas imprescindíveis para as investigações.
Em um trecho do despacho, a juíza relata suspeitas de descumprimento da lei para a construção de loteamentos, do Plano Diretor, para redução de Áreas de Preservação Permanente (APPs) e para ocupação desordenada. Todas as irregularidades ocorreriam para aprovar projetos que favoreceriam as três empresas.
As investigações contaram com o monitoramento telefônico dos suspeitos por, pelo menos, quatro meses. Uma manifestação do Ministério Público Federal incluída na decisão judicial destaca que há elementos para comprovar as denúncias, principalmente à de formação de quadrilha para a obtenção de licenças ambientais falsas, através da aprovação de projetos para alterar o Plano Diretor.
Secretário é preso na casa de um familiar, em Curitiba
Ontem, o dia foi de intensa movimentação na sede da Superintendência da Polícia Federal, em Florianópolis. Dois funcionários da empresa Proactiva (e não três como informado inicialmente pela Polícia Federal), presos em São Paulo na quarta-feira, foram trazidos de avião a Santa Catarina e já estão na carceragem do órgão. Celso Kiyoshe Takeda e Raul Alberto Dellvalle Ferreyra desembarcaram escoltados por policiais no Aeroporto Hercílio Luz.
O secretário do Meio Ambiente de Biguaçu, Sandro Roberto Andretti, foi preso, ontem de manhã, em Curitiba. Os policiais o localizaram na casa de um familiar. Uma equipe de agentes da Capital foi ao Paraná e esperava trazê-lo a Florianópolis na noite de ontem, mas poderia transferir a remoção para hoje. Os presos estão em três celas da carceragem da PF. Familiares e advogados passaram manhã e tarde no saguão da superintendência, mas só os defensores tiveram acesso aos presos.
O Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região, em Porto Alegre, recebeu, até o início da noite de ontem, cinco pedidos de habeas-corpus e um mandado de segurança dos advogados dos presos. O desembargador Paulo Afonso Brum Vaz determinou, às 18h de ontem, prazo de 24 horas para a Vara Federal Ambiental da Capital prestar as informações sobre o caso ao TRF para que sejam julgados os pedidos de liberdade.
Por motivo de saúde, o empresário Fernando Marcondes de Mattos, 70 anos, dono da Inplac, de Biguaçu, foi transferido, com autorização da Justiça, quarta-feira à noite, para a clínica particular SOS Cárdio, no Centro da Capital. Ele deve permanecer no local até o vencimento da prisão temporária, que dura cinco dias e se encerra na segunda-feira pela manhã.
Vereador agia como articulador
No texto em que autoriza as prisões da Operação Dríade, a juíza Marjôrie Cristina da Silva afirma que o vereador Luiz Carlos Rocha, o Carlito, atuava como articulador da quadrilha, defendendo os interesses da empresa Inplac, de propriedade do empresário Fernando Marcondes de Mattos, em Biguaçu.
Documentos anexados ao inquérito revelam que Rocha exercia grande influência nos demais vereadores e junto à Secretaria de Meio Ambiente. O cargo é ocupado por Sandro Roberto Andretti, que teria sido indicado por Carlito. O suspeito tomaria as decisões em conjunto com Marcondes de Mattos.
O documento da Justiça afirma que o empresário procurava interferir nas decisões do Legislativo local. O despacho da juíza contém três conversas dele com diferentes vereadores. Nelas, Marcondes de Mattos trata de alterações no Plano Diretor. As supostas manobras seriam para permitir a construção de um empreendimento no terreno ao lado da sede da empresa, às margens da BR-101. Para isso, seria canalizado um córrego. A terraplanagem era feita pela Rochas e Rochas, cujo dono é Carlito. No entanto, para a Fatma, foi informado que o serviço seria feito pela Secretaria do Meio Ambiente.
A obra foi embargada pelo Ibama, em abril, mas a decisão não foi obedecida. Em nova visita, em julho, os fiscais perceberam que os trabalhos continuaram. A juíza escreveu que a canalização do córrego foi defendida como uma obra para evitar enchentes nas redondezas. No entanto, sustenta no documento, o objetivo era o empreendimento imobiliário.
Empresa teria pago propina a políticos
A empresa Proactiva é investigada pela suposta oferta de R$ 2 milhões a vereadores e a um ex-prefeito para obter de forma fraudulenta a concessão dos serviços de fornecimento de água em Biguaçu.
O despacho da juíza Marjôrie Cristina da Silva contém um trecho que informa que metade do valor já teria sido distribuído. Os nomes não são citados.
O documento ainda relata suspeitas de irregularidades no tratamento de lixo, em especial o hospitalar que seria depositado em local inapropriado e não receberia o tratamento adequado no aterro de Biguaçu. O gerente sanitário, Ernani Luiz Santa Ritta, e o diretor da empresa no Estado, José Luiz Piccoli, são suspeitos de alterar provas para dificultar a constatação das irregularidades. Ambos estão presos.
Em um diálogo gravado em 22 de agosto, às 8h56min, Piccoli conversa com um funcionário responsável pelo conserto de uma máquina. Ele orienta o mecânico sobre como deseja que o serviço seja feito.
- Eu quero uma coisa para inglês ver, entendesse? Eu quero que monte um circo aí. - ordenou.
Funcionário denunciou a precariedade do aterro
Outro trecho do despacho contém uma interceptação telefônica que sugere que o diretor da empresa não está preocupado com a eficiência dos equipamento. Na gravação feita em 22 de agosto, às 17h03min, Piccoli diz:
- Eu quero que aquilo lá (a autoclave, máquina para esterilizar resíduos hospitalares) seja só para parecer que funciona.
Em depoimento à Polícia Federal ainda na fase de investigação, o funcionário responsável pela manutenção dos equipamentos declarou que estava cansado de falar com os diretores da Proactiva sobre a precariedade do aterro sanitário. Ele disse que sugeriu mais investimentos, mas relatou que os diretos iam "tocando com a barriga".
A respeito de um acidente sofrido por funcionário em 22 de agosto com material hospitalar, uma gravação entre funcionários revela que haveria "um monte de seringas no local". As pessoas feridas eram encaminhadas ao Hospital Nereu Ramos, em Florianópolis, especializado em doenças infecto-contagiosas. Na instituição, eram tratadas com medicamentos anti-retrovirais, os mesmos remédios usados por portadores de HIV.
Apesar das supostas irregularidades, a Proactiva tentava conseguir o ISO 14000, destinado a empresas que são modelo na gestão ambiental.
Aprovação incomum para estaleiro
Os projetos para a implantação de um estaleiro da Schaefer Yachts em Biguaçu foram aprovados com uma rapidez incomum, aponta o despacho da juíza Marjôrie Cristina da Silva, da Vara Federal Ambiental.
O texto do documento cita denúncias de pagamento de propina para vereadores e membros do Executivo.
No trecho que trata do proprietário do estaleiro, Márcio Luz Schaefer, está escrito que os projetos que alteravam o Plano Diretor da cidade e permitiriam a construção da fábrica de barcos foram aprovados em um dia. No despacho da Justiça consta que "sete vereadores teriam recebido valores em espécie".
O empresário teria contado com a ajuda do presidente da Câmara de Biguaçu, Manoel Airton Pereira, e do secretário de Planejamento, João José Morfim Neto.
Morfim também aparece em uma conversa com Schaefer, gravada às 15h48min, do dia 8 de julho, tratando da dragagem do Rio Biguaçu. O texto da juíza afirma que Morfim teria acesso a quase todos os setores da prefeitura.
Mudança na legislação feriu as leis ambientais
Ele é caracterizado como "um dos membros mais atuantes da organização". Também intercederia junto à Fundação do Meio Ambiente de Santa Catarina (Fatma).
O órgão tem três servidores investigados por suspeita de conceder licenças irregulares à Schaefer Yachts: Márcio Rosa, Zeno Silveira de Souza Brito e Newton Luiz Cascaes Pizzolatti, este também envolvido na Operação Moeda Verde, deflagrada em maio do ano passado em Florianópolis.
O relatório da Justiça demonstra que uma região que era de Área de Preservação Permanente (APP) foi modificada para Área Industrial. A alteração modificaria uma série de leis ambientais, de acordo com o texto da juíza federal.
As investigações da Polícia Federal apontaram que o estaleiro teria intercedido nos poderes Legislativo e Executivo para alterar o Plano Diretor e permitir a construção de uma fábrica de barcos de luxo em Biguaçu.
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